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Carlos Nuno Salgado Vaz | 16 Jul 2016
Décimo Sexto Domingo (Ano C)
Para nós, cristãos, deveria haver apenas um desejo essencial: a escuta assídua do Senhor, isto é, deixar que Cristo seja realmente o Senhor da nossa vida; que seja ele, com a sua Palavra e as suas ações a orientar-nos na nossa existência.
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A caminho de Jerusalém, Jesus chega a Betânia, onde é acolhido pelas irmãs Marta e Maria. Este facto é, em si, revolucionário. A descrição de Maria, sentada aos pés de Jesus, a escutá-lo, serve para dizer que também ela está incluída como discípula, como aluna de Jesus. E a revolução está em que, no tempo de Jesus, nenhum rabino teria aceite uma mulher entre os seus discípulos.

Com efeito, os rabinos afirmavam: 'É melhor queimar a Bíblia do que pô-la na mão de uma mulher'. E acrescentavam: 'as mulheres não ousem pronunciar a bênção antes das refeições'. E ainda: 'Se uma mulher vai à sinagoga, esteja escondida, não apareça em público'.

A esta luz, é mais fácil compreender quanto tem de revolucionária a opção de Jesus em acolher entre os seus discípulos também as mulheres.

Escuta da Palavra

Uma outra observação importante é que o narrador não diz que Maria ouvia as palavras, as tagarelices, mas a Palavra, o Evangelho. Maria é o modelo de quem, na sua vida, dá prioridade à escuta da Palavra. Esta é que é a maneira perfeita de acolher com verdadeira hospitalidade: prestar atenção ao hóspede que se recebe e escutar aquilo que veio dizer-nos. Mais do que preparar-lhe coisas para o alimentar fisicamente, é importante, um bocado à maneira de Abraão, sair da tenda e ir ao encontro do hóspede que vem.

Marta, como tantos, hoje, anda atarefada com muitas coisas e sente-se meio perdida, criticando inclusive a irmã e também Jesus por não chamar a atenção dela no sentido de a ir ajudar nas suas tarefas.

Marta não é censurada porque trabalha, mas porque se agita, anda distraída com tanto trabalho, está ansiosa, preocupada, atarefada com muitas coisas e, sobretudo, porque se empenha no trabalho sem ter antes escutado a Palavra, dando-lhe prioridade.

Maria é elogiada, mas não porque não faz nada ou porque finge não se dar conta do trabalho na cozinha. Jesus não diz que Marta não tem razão quando lhe lembra os empenhos concretos; não sugere a Maria que se faça de esperta e deixe que a irmã se arranje sozinha. Diz apenas que a coisa mais importante, aquela à qual é preciso dar prioridade – se não se quer que a nossa atividade se reduza a agitação – é escutar a Palavra.

Lucas quer dar uma catequese às primitivas comunidades cristãs. Sabe bem que havia muita gente boa e cheia de boa vontade, muitos discípulos que se dedicavam ao serviço de Cristo e dos irmãos e que não poupavam tempo, energias e dinheiro.

E, no entanto, também nesta intensa e generosa atividade se esconde um perigo: que muito trabalho febril seja separado da escuta da Palavra, que se torne agitação, confusão, nervosismo, precisamente como o de Marta. Até mesmo o empenho apostólico, as escolhas comunitárias, os projetos pastorais, se não forem guiados pela Palavra, pela escuta do Evangelho, se reduzem a rumores vãos, a um agitar desordenado de tachos e panelas.

Escolheu a parte boa

Maria escolheu a parte ou porção boa – não a melhor, como aparece na tradução – porque ouviu e escutou de todo o coração e a tempo inteiro a Palavra.

Também Maria, a Mãe de Jesus é elogiada pelo mesmo motivo: porque estava atenta à Palavra e guardava-a no seu coração. Resulta deveras curioso que os modelos de escuta da Palavra que nos são propostos nos Evangelhos sejam todos representados por mulheres.

Na narrativa em análise, Maria não diz uma única palavra, nem sequer para se defender, para esclarecer a sua posição, para explicar a sua própria escolha. Cala-se. E tudo leva a supor que o seu silêncio – sinal de meditação e de interiorização da Palavra – tenha continuado também em seguida.

É Marta quem agora precisa de se sentar aos pés de Jesus em atitude de verdadeira discípula, mais do que como dona de casa e da casa. Ela precisa de escutar Jesus para recuperar a calma, a serenidade interior e a paz.

Marta é generosa, diligente, dinâmica, mas cometeu um erro: sobrecarregou-se de trabalho, antes de se confrontar com a Palavra. Quem de verdade escuta Cristo, não esquece o empenho pelas pessoas. Aprende, sim, a desempenhá-lo de maneira certa... sem agitação. E dando a prioridade e a atenção ao que deveras o merece.

A escuta assídua do Senhor

Para nós, cristãos, deveria haver apenas um desejo essencial: a escuta assídua do Senhor, isto é, deixar que Cristo seja realmente o Senhor da nossa vida; que seja ele, com a sua Palavra e as suas ações a orientar-nos na nossa existência. Ele, precisamente de quem o Pai disse: «este é o meu Filho muito amado! Escutai-o».

Não basta servir. É necessário tornarmo-nos servos. E Maria, sentada aos pés de Jesus para escutar a sua Palavra, é como a serva do Senhor atenta à sua voz.

Marta e Maria habitam em nós de modo quase inseparável. Muitas vezes, é Marta que prevalece. Impõe-se mais o nosso ativismo que o verdadeiro serviço.

Maria, pelo contrário, está dormente nas nossas profundidades. Para a deixarmos emergir, é preciso morrer ao próprio egoísmo e ressurgir na atitude de quem se põe aos pés de Jesus a escutar a sua Palavra com um coração unificado. Só assim poderemos fazer bem todas as coisas e seremos realmente felizes, como o afirma a promessa de Jesus: «Felizes aqueles que escutam a palavra de Deus e a põem em prática». (Lucas 11, 28).

E não esqueçamos o convite do Senhor: «Eu estou à porta e chamo. Se alguém ouvir a minha voz e me abrir a porta, entrarei em sua casa e cearei com ele» (Apocalipse 3, 20)

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Palavras-Chave:
Lucas  •  Marta  •  Maria  •  Décimo Sexto Domingo  •  Palavra
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