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DACS | 22 Jun 2022
De propósito ou não, o Papa deu uma pista valiosa para o conclave
Um dos escolhidos para cardeal pelo Papa Francisco pediu autorização para recusar a designação pelo seu tratamento que deu no passado a casos de abusos sexuais. E se fosse a eleição de um Papa? Artigo de John L. Allen Jr.
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  © AP Photo/Yorrick Jansens

Mesmo antes do Papa Francisco organizar mais um consistório a 27 de Agosto, introduzindo 20 novos elementos no clube mais exclusivo da Igreja Católica, o evento já é notícia – neste caso, não tanto pelos cardeais que lá vão estar, mas o outrora cardeal-designado que não vai.

Na passada quinta-feira, a conferência de bispos da Bélgica anunciou que o antigo bispo de Ghent, Lucas Van Looy, com 80 anos, obteve permissão do Papa Francisco para recusar a sua criação como cardeal, que o pontífice tinha anunciado durante o tradicional discurso Regina Caeli a 29 de Maio.

A razão para a revogação é que o registo de Van Looy sobre abusos sexuais na Igreja ficou debaixo de fogo e, inevitavelmente, criá-lo como cardeal seria visto como insensível e ofensivo para os sobreviventes de abusos.

Há várias questões por esclarecer sobre o assunto, mas a maior conclusão é esta: quer tenha sido intencional ou não, o Papa Francisco fez um favor aos cardeais que vão eleger o seu sucessor, seja quando esse momento for, ao lembrá-los que seja quem for que escolhem deve ter um registo limpo sobre o assunto dos abusos sexuais, ou o próximo pontificado vai começar sob uma nuvem que pode nunca se dissipar.

O próprio Van Looy, sejamos claros, nunca foi um candidato sério ao cargo. Por um lado, era uma das escolhas “honorárias” do Papa Francisco, já que, por ter mais de 80 anos, não poderia sequer participar no próximo conclave.

No entanto, se mesmo uma nomeação relativamente simbólica pode gerar uma reacção tão feroz, pense no que seria se a honra fosse infinitamente maior, isto é, o próprio pontificado.

Resumindo brevemente as acusações contra Van Looy, que foi nomeado para Ghent em 2004 e resignou em 2019, é acusado de várias flahas em casos de abuso.

Em 2005, Van Looy terá pago 25 mil dólares a uma vítima de um padre belga, Omer Verbeke, mas não notificou as autoridades civis do facto que Verbeke continuava a dirigir um orfanato até 2014, quando se tornaram públicas as acusações.

Em 2007, Van Looy nomeou outro padre belga, que tinha sido considerado culpado de abusar sexualmente um menor em 1994, para uma nova paróquia. Quando o caso foi divulgado à imprensa local em 2010, Van Looy defendeu a decisão: “depois de muita deliberação, decidimos que podíamos dar-lhe outra hipótese”, disse Van Looy. “Também não houve novas alegações. Ele cometeu erros, mas estão no passado”.

Em 2010, testemunhando perante um comité parlamentar belga sobre abusos sexuais, Van Looy reconheceu que não tinha reportado seis queixas contra padres às autoridades civis, dizendo que os seus casos pareciam “menos prementes” porque todos já estavam reformados. Não é claro se Van Looy enviou as queixas à Congregação para a Doutrina da Fé, no Vaticano, como era obrigado a fazer de acordo com os termos de um motu proprio do Papa João Paulo II em 2001.

Em 2013, Van Looy, que também é membro da Ordem dos Salesianos, tinha conhecimento de uma decisão de permitir que outro padre belga, chamado Luk Delft, aceitasse uma nomeação na República Centro-Africana com a instituição católica global Cáritas, apesar de Delft ter sido condenado na Bélgica, no ano anterior, por duas acusações de abuso de crianças e posse de pornografia infantil. Na República Centro-Africana, Delft foi ainda acusado de dois crimes de abuso.

Tudo isto se soma ao facto que os críticos apontam que Van Looy favoreceu dois grupos controversos dentro da Igreja belga, Het Werk (O Trabalho) e Blauwe Zusteres (Irmãs Azuis), ambas acusadas de abusos de consciência e autoridade.

Presumivelmente, nada disto foi o que fez Francisco escolher entregar um solidéu vermelho a Van Looy, que foi escolhido pelo Papa para um cargo de liderança na Cáritas em 2015 e também nomeado como um dos delegados pessoais do Papa no Sínodo dos Bispos sobre os jovens em 2018. O mais provável é que Francisco quisesse agradecer a Van Looy por estes serviços.

Ainda assim, a parte preocupante desta história é que tudo o que está escrito acima sobre o registo de Van Looy no tema da crise de abusos estava disponível para qualquer pessoa com acesso ao Google. De facto, a notícia sobre Delft teve grande destaque na CNN em 2019, sob o título “O caso do padre pedrador”.

Van Looy não é um único cardeal-designado na mais recente fornada a ter um passado debatível.

O bispo Oscar Cantoni, de Como, no norte da Itália, também atraiu critícas pelo seu papel num pré-seminário, patrocinado pela diocese de Como e localizado no Vaticano até ser alterado pelo Papa Francisco, no qual alegadamente aconteceram abusos. Cantoni foi chamado para testemunhar perante um tribunal do Vaticano, em Fevereiro de 2021, sobre o seu papel na ordenação presbiteral de um dos alegados (e eventualmente absolvido) abusadores.

O tribunal considerou que, enquando havia claramente uma atmosfera sexualizada no pré-seminário, não foi provado que o comportamento em questão constituísse abuso. Pela sua parte, Cantoni concedeu que ele recebeu relatórios negativos sobre o futuro padre entre 2006 e 2012, mas descreveu-os meramente como prova “de uma tendência homossexual transitória ligada à adolescência”.

Francisco obviamente está ciente desse episódio, já que o julgamento decorreu com a sua permissão e dentro do próprio Vaticano.

Naturalmente, presume-se que Francisco tinha informação que o levou a decidir criar Van Looy e Cantoni como cardeais, apesar das questões à volta dos dois homens.

No entanto, o episódio oferece um lembrete que se a reputação de um novo cardeal pode ser danificada por associação com esses escândalos, ao ponto que um deles se sente compelido a recusar a designação apesar desta ser quase inteiramente simbólica – bem, como dizem os italianos, magari un papa!

Imagine-se, por outras palavras, se fosse o novo Papa.

Claro, pouco depois de Francisco ser eleito houve precisamente uma tentativa breve de o ligar a alguns casos de abuso mal tratados durante o seu tempo na Argentina, mas esse esforço caiu por terra quando se tornou claro que os padres envolvidos não eram de Buenos Aires e nunca estiveram sobre a autoridade directa do então cardeal Jorge Mario Bergoglio. Muito como tentativas semelhantes de sujar o nome do novo Papa com ligações à Guerra Suja da Argentina, o exame crítico largamente dissipou as dúvidas.

Fica, então, o memorando aos 133 cardeais-eleitores que serão elegíveis para votar, a partir de 27 de Agosto, no próximo conclave: podem querer certificar-se que quaisquer dúvidas sobre quem quer que estejam a considerar possam ser resolvidas de forma semelhante, porque a última coisa de que a Igreja provavelmente precisa é um cenário como o de Van Looy numa escala infinitamente maior.

 

Artigo de John L. Allen Jr. publicado a 19 de Junho de 2022 no site Crux

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