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7 Fev 2021
Ai de mim se não evangelizar
Homilia no Dia da Universidade Católica
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Nos Domingos anteriores tenho falado da centralidade da Palavra de Deus. Na sua ausência, o Cristianismo é inconcebível e a Igreja torna-se irreconhecível. Necessita, por isso, de arautos preparados e apaixonados. Fala por si no íntimo das consciências mas necessita também de comunicadores que a coloquem no coração da cidade dos Homens. Percorrer as páginas da Sagrada Escritura significa encontrar-se com homens e mulheres protagonistas de uma gesta que permitiu que a fé chegasse até aos nossos dias.

O dia de Jesus passado em Cafarnaum mostra uma vida entregue à causa do Reino, sublinhando a alegria e a responsabilidade do anúncio mas, sobretudo, dizendo aos vindouros que tudo deve ser feito gratuitamente. Poderia entregar-se ao entusiasmo do povo mas escapou para o deserto para aí rezar. Os discípulos não conseguem entender como foi possível desperdiçar uma ocasião onde o povo estava sensibilizado para acolher a Sua mensagem. Mas Ele diz que é preciso sair da cidade e percorrer os lugares perdidos da Galileia. Numa sociedade que já foi cristianizada, como é a nossa, marcada por ambientes formativos e celebrativos, este episódio mostra-nos que é importante evangelizar onde as pessoas se encontram, não se deixando iludir pelo mais fácil e tradicional. Há outros caminhos a percorrer e o serviço à causa do Evangelho deve abrir-se à surpresa, chegar aos ambientes vitais, não permitindo que nos percamos nos meandros de uma burocracia daquilo que sempre marcou o agir da Igreja.

Sabemos que o Papa Francisco quis subordinar o seu serviço petrino a “uma nova etapa evangelizadora” com caminhos novos a percorrer e marcada pela alegria com que o Evangelho “enche o coração e a vida inteira daqueles que se encontram com Jesus”. É este o significado da Exortação Apostólica “A alegria do Evangelho” Evangelii Gaudium. Tomados pela alegria do Evangelho, a Igreja deve sair para o anunciar “a todos, em todos os lugares, em todas as ocasiões, sem demora, sem repugnância e sem medo”.

S. Paulo é eloquente quando na Carta aos Coríntios apresenta um resumo da sua vida. Interceptado por Cristo, na estrada de Damasco, não tinha outra hipótese se não evangelizar, nunca procurando títulos de glória mas anunciando gratuitamente o Evangelho sem fazer valer os seus direitos. Foi também este o caminho que indicou aos seus discípulos. Colocou grande entusiasmo e profunda dedicação tornando-se escravo da causa evangélica para ganhar o maior número. “Fiz-me tudo para todos a fim de ganhar alguns a todo o custo”. O seu testemunho não nos deixa indiferentes e permanece um desafio para todos os cristãos e comunidades. “Tudo faço por causa do Evangelho”. Terá de acontecer como exame de consciência e desinstalar-nos dos comodismos e da tranquilidade de repetir esquemas, mesmo sabendo que já não estão a resultar. Se estas palavras invadissem os nossos corações e vontades, muita inércia seria destruída e novo entusiasmo se implementaria.

A Igreja vive para evangelizar. Não tem outra opção. Deverá fazê-lo por meio de todos os cristãos, sacerdotes e leigos, individualmente ou através das instituições. Sendo hoje o dia da Universidade Católica, deixo o apelo a que interprete a sua missão nesta perspectiva. Graças ao seu corpo docente, conseguiu situar-se na vanguarda do ensino universitário. Agora importa integrar-se nesta tarefa que a Igreja lhe confia. Fora dela não é verdadeira Universidade Católica. Sabemos que o tem sido, mas este ano volta a centrar a sua missão quando afirma que é uma Universidade com valores. Valores reflectidos e transmitidos nos seus currículos, na esperança e certeza de que quem frequenta os diversos cursos pautará a sua vida por eles e tudo fará para que eles influenciem a vida da sociedade. Não faltamos à verdade reconhecendo que o grande problema da sociedade actual consiste na ausência de valores. O relativismo impôs-se. O “vale tudo” e “cada um que se arranje” conforme as suas conveniências trespassa as relações quotidianas da vida das pessoas e dos diferentes grupos sociais, políticos e de outros âmbitos. As pessoas são resistentes a tudo o que possa custar. Impôs-se uma cultura ambígua e, muitas vezes, alheia à fidelidade ao que verdadeiramente vale. Urge ser protagonista de uma outra cultura e fazê-lo com grande sentido de responsabilidade.

Há dias surgiu um livro, com prefácio do papa Francisco, que tem um título provocador e que sintetiza as prioridades para o hoje da sociedade moderna e da Igreja. Intitula-se “Demolição e reconstrução”. A crise está a manifestar a caducidade de um modelo de sociedade que inevitavelmente será demolida. Nada ficará igual, ouvimos dizer muitas vezes. É neste contexto de sofrimento que teremos de nos motivar para a tarefa de reconstruir. Aqui, o humanismo cristão não pode ser apenas um dado da história mas terá de se evidenciar com todos os valores que foi fortalecendo ao longo da história. O que desaparecerá? O que permanecerá? O que teremos de actualizar para que possa prevalecer e orientar os caminhos da Humanidade?

Os média e os fazedores da opinião pública insistem em fomentar uma cultura individualista. Importa contrapor com uma cultura da fraternidade, transformando-a numa dimensão social e política da convivência humana, das relações dos homens entre si. O cristão sabe que a fraternidade é resultado da paternidade de Deus e que é ingenuidade e verdadeira utopia querer realizá-la sem reconhecer um princípio gerador. Aqui está a simplicidade da mensagem evangélica. Um único Pai e todos irmãos.

Se a pandemia está a provocar a demolição de muitas realidades, importa um empenho e um compromisso colectivo da reconstrução de um novo modelo de sociedade que terá de partir do valor da fraternidade. Isto para que seja viável uma amizade social, como preconiza o papa Francisco na sua última carta encíclica. Seria de esperar que a Universidade Católica, no meio de tantos outros valores a assumir e a ensinar, nos oferecesse motivações para que a Igreja desse este contributo original e imprescindível para a hora que atravessamos.

Se todos, e em todo o lugar, devem anunciar o Evangelho, há outra instituição que não poderá colocar-se de lado. A família sempre ocupou um lugar de imprescindível valor na transmissão da fé. A situação de pandemia veio realçar este papel. Não se trata somente da impossibilidade das comunidades paroquiais realizarem determinadas acções catequéticas. O papel da família não é uma simples alternativa ocasional, ligada a esta situação dramática que vivemos. Ela não substitui ninguém. Tem um estatuto próprio e perde a sua identidade quando se esquece dele. 

Para preservar a sua identidade tem de crescer, de descobrir-se como comunidade de amor, expressão do amor divino que vai aprendendo através da escuta, do silêncio e da leitura orante da Palavra, assim como no diálogo construtivo que a todos une numa comunhão capaz de dar alegria a todos os dias e de ultrapassar as tristezas inevitáveis do viver humano. Não foi por ocaso que os primeiros cristãos falavam da Igreja doméstica. Hoje esta denominação volta a ser apresentada como caminho a seguir. Não se trata de algo circunstancial ou opcional. Aqui está o presente e o futuro da Igreja. Importa, por isso, que as famílias se disponham a experimentar. Com a experiência que alguns realizarão será possível propor a outras. A família evangeliza-se e evangeliza. Ter mais tempo para estar juntos pode tornar-se escola e ser um factor importante para a reconstrução do ideal de família e, por ela, da sociedade e da Igreja. Com famílias novas, o ambiente familiar transformar-se-á, permitindo a demolição de hábitos para a reconstrução de novos modelos.

Neste Dia da Universidade Católica, uma vez mais, pensemos que a Alegria do Evangelho deve motivar-nos para novos compromissos. A pandemia e o confinamento mostram a caducidade de muitos esquemas de vida. Não nos podemos resignar ao pessimismo de uma sociedade que se vai desmoronando. A Igreja, pelos seus membros, sacerdotes e leigos, terá de mostrar a vitalidade do Evangelho, acreditando nele e levando-o ao mundo com os seus complexos problemas.

Maria, mãe da evangelização, nos acompanhe nesta caminhada sinodal e samaritana.

 

† Jorge Ortiga, Arcebispo Primaz

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