Arquidiocese de Braga -

19 julho 2021

Homilia na eucaristia de ordenações presbiterais

Fotografia Francisco de Assis/DM

Na Cripta do Santuário de Nossa Senhora do Sameiro, em Braga.

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1. Envio dos sacerdotes

Caríssimos neo-presbíteros. Iniciais uma nova caminhada na vossa existência humana. Nada de novo, tudo diferente. Podereis partir com um misto de apreensão e de alegria. O futuro é sempre uma interrogação.

Importa ter uma certeza. Não caminhais sozinhos. Deus que vos chamou, ungiu e enviou, caminha convosco. Há momentos em que parece que se esconde; outros que já se escondeu e outros em que parece alhear-se da vossa vida ou, quem sabe, permitir coisas que parecem negar a promessa de um amor fiel. Acreditai na sua fidelidade. Pode fazer falta saber esperar. Nem sempre a hora de Deus é a hora dos homens. Confiai sempre. Omnia vincit amor. Tudo vence o amor.

Com Deus, tende a certeza de que o vosso arcebispo, na minha pessoa ou em quem vier depois de mim, também caminhará convosco. Com ele todas as instâncias arquidiocesanas e arciprestais. Podereis e devereis ter muitos amigos sérios em quem confiar. Dai a prioridade ao arcebispo. Não queirais resolver os problemas sozinhos. Crescei sempre no amor ao vosso prelado e à Arquidiocese. Não desconsiderando a vossa família, aqui está a família que tudo fará para que o vosso sacerdócio seja feliz.

Sentindo e experimentando o amor destes que caminham convosco, procurai caminhar com o povo que vos está confiado. Vivei intensamente a caridade. Não excluais ninguém. Tornai o vosso amor universal. Não há predilecções ou simpatias especiais a não ser com os pobres e os mais necessitados.

Caminhando no amor pelos outros, procurai saber trabalhar com a Igreja. A Igreja é ministerial. Urge descobrir talentos e vocações. Não tenhais medo dos leigos. Confiai para decidir juntos e para trabalhar responsavelmente. Trabalhai, também, com o mundo nas diferentes estruturas que ele oferece. Somos enviados ao mundo e com ele teremos de construir uma sociedade mais humana e fraterna. Procurai estabelecer áreas de acção mostrando que a Igreja está em tudo o que é humano. Tudo é campo de missão. O ambiente outrora era de cristandade. Tudo girava em torno da Igreja. Hoje reconhecemos a autonomia das realidades terrestres mas não queremos ser uma ilha em confronto ou concorrência. A sinodalidade também passa por este abrir-se e mostrar que caminhamos com a humanidade, como ela é e não como nós gostaríamos que fosse, não por proselitismo mas pelo interesse de colocar as sementes do Verbo no humano de hoje.

Uma coisa vos peço. Sede sempre fiéis às promessas que hoje, livremente, fizestes. Que o vosso coração seja indiviso. Só de Deus para ser de todos.

2. Gratidão aos pais e familiares.

Sei que é dia de grande alegria para vós caríssimos pais e familiares dos novos sacerdotes. Se é grande alegria, imagino que os sacrifícios também o tenham sido. Da minha parte e da Arquidiocese recebei um grande abraço de gratidão. Peço-vos que não considereis a tarefa de caminhar com os vossos filhos acabada. Algo de novo começa. A família deve ser sempre aquela Igreja doméstica que poderá não continuar a alimentar fisicamente mas que deverá oferecer alimento de uma ajuda espiritual para que a fidelidade aconteça na alegria de um sacerdócio para os outros. Não regateeis nada a fim de que os vossos filhos sejam, só e apenas, sacerdotes. Nunca os deixeis sozinhos, imaginando ou supondo que estão bem. A família, e sobretudo os pais, sabem ver e ajudar. Depois, acreditai que, a partir de agora, eles pertencem, também, a outra família: o presbitério. Ajudai-os a crescer, como homens mas sobretudo como sacerdotes, com os outros padres. É aqui que eles irão tecendo a sua felicidade, nada lhes faltando de material e espiritual.

Obrigado, mais uma vez, por tudo o que fizestes. Continuai a contribuir para que o sacerdócio dos vossos filhos seja de alegria, na fidelidade às promessas que hoje fizeram.

3. A Igreja é estruturalmente missionária, ad intra e ad extra, dentro das comunidades e na relação com o mundo que as rodeia mas também ao largo em espaços onde o serviço eclesial é necessário.

Sinal disso é o nosso Protocolo com a Diocese de Pemba e o trabalho que a nossa Comissão Missionária (CMAB) tem vindo a concretizar. Não podemos esmorecer. Caminhamos com outras dioceses do mundo inteiro para quem mandamos intenções de missas (a celebrar ou das Plurintencionais) que permitem aos sacerdotes um pouco de alento e serenidade, nos últimos 7 anos cerca de 2 milhões e duzentos mil euros. Pemba continuará a merecer o nosso carinho. Sabemos que a Província de Cabo Delgado, em Moçambique, continua a ser local de muitas mortes, de desalojamentos, destruição de residências e ocupação dos terrenos que alimentam aquelas populações. Queremos ser uma voz que defende aquelas populações. Para a paróquia de Stª. Cecília de Ocua já enviamos 522.648,03 €.

Por aquela terra, falamos, comprometemo-nos com a ajuda humanitária e enviamos os nossos voluntários. O ano passado enviamos, neste dia, dois que não puderam partir por causa da pandemia. Só agora foi possível ultrapassar complicações burocráticas e de vistos de ingresso. O P. António Faria e a Fátima Castro irão partir no próximo mês. Agradecemos-lhes que sejam uma presença da Arquidiocese na paróquia de Sta. Cecília de Ocua que já a consideramos nossa.

Também oportunamente enviaremos dois contentores de materiais recolhidos que, infelizmente por razões burocráticas, não foi possível fazer.

4. O Concílio de Trento, no Cap. XVIII da sessão 23, determinou que em todas as dioceses existissem Seminários para a formação dos futuros sacerdotes. S. Bartolomeu dos Mártires regressa de Trento em 1563 e antes de partir para lá entrega aos Jesuítas a condução do Colégio de S. Paulo para o estudo de Humanidades e Artes.

Quando regressa não se tranquilizou antes de construir um Seminário. Começou pela Casa do Seminário em Montalegre. Em Braga foi necessário comprar algumas casas que foram demolidas, no Campo da Vinha. As obras de construção iniciam-se em 1571. No início do ano académico de 1572 já lá alguns estudantes residiam se bem que as obras ainda não estivessem concluídas. Os seminaristas deveriam frequentar as aulas de Filosofia e Humanidades no Colégio de S. Paulo e Teologia no Colégio do Pópulo que pertencia aos padres Agostinhos.

Olhando para estas datas concluímos que este ano estamos a celebrar 450 anos do início das obras e no próximo celebraremos os mesmos anos de existência do nosso Seminário. Somos um Seminário Conciliar e dos mais antigos do mundo. As equipas dos nossos Seminários irão preparar um programa para uma celebração condigna. Não fugiremos do nosso Programa Pastoral sobre a sinodalidade. Queremos que a Arquidiocese tome consciência de que deve caminhar com os Seminários. Arquidiocese e Seminários distinguem-se, mas são uma coisa só. Não podemos estar com a Diocese se não estamos com os Seminários. Esta consciência tem de ser reavivada e tornada mais visível. Toda a pastoral é vocacional. Somos todos amados e chamados. Na Igreja Arquidiocesana assumimos tarefas e vocações diferentes. Juntos trabalhamos para que rapazes e raparigas descubram a sua vocação. Mas o Seminário tem de estar no coração de todos. Espero que estas celebrações se traduzam num amor real ao secular Seminário, naquilo que ele é e significa.

5. Estamos ainda num tempo de pandemia. Foram duros os últimos meses. Muita perplexidade e interrogação. Fazer? Não fazer? O que fazer? Como fazer? Queremos voltar à normalidade que desejamos que seja nova. Nada será como dantes. Espera-nos muita inovação e criatividade.

Para o que poderá vir a acontecer, precisamos de recuperar o entusiasmo e a resiliência. Às vezes pressinto algum desânimo, desencanto, esmorecimento. Teremos de reinterpretar a crise, provocada pela pandemia na economia, na saúde, no social mas também, não o ignoramos, no religioso. O cenário da Arquidiocese está diferente e encontrará outras realidades que ainda não descortinamos. A tudo teremos de reagir. A crise exige uma positividade, uma inversão de marcha, um reconhecer uma aurora, um verificar que as amendoeiras começam a florir e preanunciam uma primavera. Deixemo-nos de lamentações e cânticos de tristeza. Há muitas músicas novas para interpretar. Acordemos do sono e da letargia. Demos as mãos entre todos os sacerdotes, com todos os leigos, com os movimentos e associações. Cristo vive. É hora de esperança e de reinício de uma nova era. Caminhando juntos, venceremos o vírus e todas as consequências nefastas. É hora de graça. Um autêntico Kairos. Assim todos o queiram.

† Jorge Ortiga, Arcebispo Primaz


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