Arquidiocese de Braga -

30 dezembro 2020

Vaticano: vacinas para todos, um mundo mais justo e saudável

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DACS | Foto: Daniel Schludi

Comissão do Vaticano para a Covid-19 e Academia Pontifícia para a Vida publicam nota sobre vacinas.

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A Comissão do Vaticano para a Covid-19 e a Academia Pontifícia para a Vida publicaram ontem uma nota intitulada "Vacinas para todos. 20 aspectos para um mundo mais justo e saudável".

O documento divide-se em três partes: a) contexto, b) sobre as vacinas e c) orientações para a Comissão do Vaticano para a Covid-19.

Da nota sobressai o apelo da Santa Sé para que todos possam ter acesso às vacinas e a "responsabilidade moral" de cada um em ser vacinado voluntariamente.

 

Contexto

A Santa Sé começa por referir que os efeitos da Covid-19 vão muito para além da saúde, ao exacerbarem vários tipos de crise, como a económica e a sociológica que, expectavelmente, acabam a afectar de forma desproporcional os mais pobre e vulneráveis.

"À medida que avançamos em direção a uma recuperação justa, devemos assegurar que as curas imediatas para as crises se tornem degraus para uma sociedade mais justa, com um conjunto de sistemas inclusivos e interdependentes. Tomar medidas imediatas para responder à pandemia, tendo em mente os seus efeitos a longo prazo, é essencial para uma «cura» global e regenerativa", pode ler-se.

Citando a Fratelli Tutti, a Comissão diz mesmo que, se as respostas se limitarem apenas ao nível organizacional e operacional, sem o reexame das causas das dificuldades actuais, nunca existirão as tão necessárias transformações sociais e planetárias.

 

Sobre as Vacinas

A Nota discorre de seguida sobre as vacinas, evidenciando "valores e princípios fundamentais" e apelando novamente a uma vacina disponível para todos. 

"Na sua recente mensagem de Natal Urbi et Orbi, o Papa afirmou que as vacinas, para «iluminar e trazer esperança a todos, devem estar disponíveis a todos ... especialmente aos mais vulneráveis e necessitados de todas as regiões do planeta». Esses princípios de justiça, solidariedade e inclusão devem ser a base de qualquer intervenção específica e concreta em resposta à pandemia", afirma a Comissão.

Os princípios apontados são o mote para a Nota relembrar o que também já foi dito pelo Papa Francisco em várias ocasiões: as vacinas têm um "ciclo de vida" que deve ser considerado no seu todo, sobretudo tendo em conta as suas implicações éticas. A Nota pede a releitura da instrução  Dignitas Personae e dos documentos publicadospela Academia Pontifícia para a Vida em Setembro de 2005 e 31 Julho de 2017.

"Neste contexto, consideramos importante que seja tomada uma decisão responsável a este respeito, uma vez que a recusa da vacina também pode constituir um risco para terceiros."


"Os diversos mecanismos de produção e acção das vacinas são significativos no que diz respeito à logística de distribuição (principalmente em relação à temperatura em que são armazenadas) e sua capacidade de protecção contra infecções ou manifestações clínicas da doença. No primeiro caso, quando a vacina protege contra a infecção, ela contribui para a imunidade de grupo. Por outro lado, neste último caso, quando a infecção chega sem manifestações clínicas, a vacina não reduz a circulação do vírus (daí a necessidade de vacinar directamente aqueles que estão em maior risco)", sublinha a Nota.

A Santa Sé enfatiza ainda a necessidade de uma vacina "colaborativa", em que não impere a sua exploração comercial, até porque esta sinergia tornará mais fácil o acesso à vacinação em todas as partes do mundo.

Sobre o processo de vacinação, a Nota diz ainda que é normal que haja fases diferentes e que não há dúvida de que os profissionais de saúde devem ser os primeiros a ser vacinados, mas há uma "área cinzenta" no processo que também deve ser tida em conta. A Comissão sugere que as pessoas para quem é impossível cumprir as medidas de restrição sejam vacinadas o quanto antes.

"Esta ordem de administração, a nível internacional, implica que «a prioridade deve ser dada à vacinação de algumas pessoas em todos os países, ao invés de todas as pessoas em alguns países» (Diretor da OMS). Deve-se evitar que alguns países recebam a vacina tardiamente devido à compra anterior em grande escala por estados mais ricos. Trata-se de chegar a acordo sobre as percentagens específicas para proceder concretamente. A distribuição de vacinas requer uma série de ferramentas que devem ser especificadas e implementadas para atingir os objectivos acordados em termos de critérios de acessibilidade universal", é possível ler.

A Comissão refere de seguida a responsabilidade moral de ser submetido a vacinação, já que esta problemática diz respeito à relação de interdependência entre saúde pessoal e pública.

"Neste contexto, consideramos importante que seja tomada uma decisão responsável a este respeito, uma vez que a recusa da vacina também pode constituir um risco para terceiros. Isso também se aplica se, na ausência de uma alternativa, a motivação é evitar o benefício dos resultados de um aborto voluntário. Na verdade, nesses casos, como afirma a Congregação para a Doutrina da Fé, pode ser considerado «moralmente aceitável», sob condições precisas, «receber vacinas Covid-19 que usaram linhagens celulares de fetos abortados em sua pesquisa e produção processo»", realça a Nota.

A Comissão relembra ainda que o adoecimento de pessoas leva a um aumento de internamentos, com consequente sobrecarga dos sistemas de saúde, até um possível colapso, como já aconteceu em vários países durante esta pandemia e que também viram dificultado o acesso aos cuidados de saúde, o que, mais uma vez, atinge quem tem menos recursos.

 

Orientações

Para uma maior clareza do trabalho da Comissão, na Nota foram apresentadas alguns objectivos para o trabalho a ser feito em relação à vacina e que traduziremos de seguida. "Transparência e comunicação correcta são essenciais para promover a confiança e a adesão ao processo de vacinação", diz a Santa Sé.


OBJECTIVO 1: Avaliação ético-científica. Com base na ciência disponível, a Comissão poderá contribuir para as avaliações da qualidade, metodologia e preços das vacinas, necessários para uma distribuição equitativa aos mais vulneráveis.

Acções necessárias: Actuar junto às principais organizações que desenvolvem, avaliam, entregam e administram vacinas, podendo, quando necessário, opinar sobre as posições públicas sobre a qualidade / equidade das propostas de distribuição e aproveitamento. Por este motivo, a Comissão pretende ter acesso às informações científicas mais precisas, bem como utilizar várias capacidades para auditar as vacinas propostas e as estratégias de tratamento, em particular no que respeita ao seu impacto nos mais vulneráveis. Como indica o Santo Padre, “não podemos permitir que as várias formas de nacionalismo fechadas em si mesmas nos impeçam de viver como a família verdadeiramente humana que somos”. Devemos fornecer “vacinas para todos ... [colocando] antes de todos os outros os mais vulneráveis e necessitados!” 


OBJECTIVO 2: Cura global com “sabor local”. Uma cura global, com sabor local (programas de vacinas informados localmente): o nosso objectivo é desenvolver recursos para ajudar as igrejas locais na preparação para esta iniciativa de vacina e protocolos de tratamento para essas pessoas nas suas comunidades específicas.

Acções necessárias: Trabalhar em estreita colaboração com as dioceses e comunidades cristãs em todo o mundo para entender as suas necessidades variadas e usar essa informação para desenvolver posições robustas, recomendações e ferramentas adequadas às várias necessidades. Isto vai começar ao ouvirmos as igrejas locais, ajudando-as depois a defender certas estruturas e apoios do governo e de outras agências.


OBJECTIVO 3: Parceria e participação. Ter uma estreita colaboração com as várias organizações necessárias para contribuir com o planeamento, execução e avaliação das recomendações para a administração global de vacinas.

Acções necessárias: Trabalhar com representantes das principais instituições e organizações envolvidas, bem como organizações globais de saúde, ONGs e organizações doadoras para ajudar no desenvolvimento, avaliação e participação em soluções.

OBJECTIVO 4: Unindo forças. Colaboração efectiva com os grupos de trabalho da Comissão e outros grupos eclesiais para propor as melhores recomendações possíveis à Igreja.

Acções necessárias: Trabalhar com as outras Equipas de Trabalho da Comissão usando a estrutura da Laudato si ’e da Fratelli Tutti, levando em consideração as suas recomendações para as recomendações finais feitas pela Comissão.


OBJECTIVO 5: Liderança. Aprofundar a compreensão e o compromisso da Igreja na protecção e promoção da dignidade de todos concedida por Deus.

Acções necessárias: Ajudar a Igreja universal e o mundo a articular e modelar as razões mais profundas para enfrentar este desafio como família humana global. A Igreja pode oferecer-se para funcionar como um catalisador para enfrentar este desafio de uma forma que reflicta uma consciência e respeito pela dignidade de todos.


OBJECTIVO 6: A Igreja ao serviço da “cura do mundo”. Liderar pelo exemplo de maneira clara e que contribua significativamente, entre outras coisas, para alcançar a meta de distribuição equitativa de vacinas e tratamentos.

Acções necessárias: Usar criativamente as vozes da Igreja em todo o mundo para falar, exortar e contribuir para garantir que vacinas e tratamentos de qualidade estejam disponíveis para a família global, especialmente os vulneráveis. A Igreja tem muitas maneiras de ajudar nisso, como com as suas redes de saúde, as Conferências Episcopais, várias organizações eclesiásticas que ajudam os pobres, comunidades religiosas, etc. Devem ser consideradas doações a grupos que trabalham para levar tratamentos e vacinas aos mais necessitados.