Arquidiocese de Braga -
16 outubro 2025
São Frutuoso regressa ao lugar onde quis morrer e ficar sepultado
Cónego Hermenegildo Faria
A celebração da trasladação das relíquias de São Frutuoso para a Capela-Mausoléu terá lugar no próximo sábado, dia 18
A celebração da trasladação das relíquias de São Frutuoso para a Capela-Mausoléu terá lugar no próximo sábado, dia 18, às 18h30, sendo presidida pelo Arcebispo de Braga, D. José Cordeiro.
Para além de diversas entidades civis e académicas, o momento contará com a presença de Dom Duarte Pio, Duque de Bragança — encerrando, assim, um ciclo milenar de devoção, memória e justiça histórica.
A última vontade de São Frutuoso
Entre os anos de 665 e 667, morria em Braga o Bem-aventurado Frutuoso, celebrado como irrepreensível e justo desde a meninice. Conta o seu biógrafo, Valério, que São Frutuoso, sentindo a morte aproximar-se, empenhou-se em trabalhar dia e noite na construção da Capela, para que não estivesse inacabada no dia do ocaso da sua vida terrena.
Terminada a obra, no fim do discurso dos seus anos, pediu que o levassem à Capela. Entre prantos e lágrimas, os seus irmãos cumpriram esta sua última vontade. Não saiu mais da Capela: prostrou-se no chão e aí permaneceu diante do altar sagrado até ao seu último suspiro.
Imediatamente, o sagrado sepulcro do corpo deste santo tornou-se destino de peregrinos. Como escreve o seu biógrafo:
“Sem dúvida, junto do seu túmulo, não só os enfermos são curados, mas também os demónios são afugentados, e todo aquele que amargurado implorar o seu poderoso auxílio, imediatamente alcança do Senhor completo fruto das suas preces.”
As vicissitudes da história, porém, fizeram com que a última vontade de São Frutuoso fosse desrespeitada. No próximo sábado, ele voltará ao lugar onde quis morrer e ficar.
O roubo das relíquias e a longa espera pela restituição
No nefasto ano de 1102, o ambicioso bispo de Compostela, temendo que a recuperação da dignidade metropolitana da recém-restaurada diocese de Braga pudesse fazer sombra às suas ambições, decidiu — na calada da noite e desprezando a hospitalidade de São Geraldo — roubar as relíquias de São Frutuoso. Quis assim prevenir que o fluxo de peregrinos fosse desviado para Braga, mas ignorou e desconsiderou a última vontade do santo.
Para que um roubo seja perdoado, deverá haver restituição. Por isso, ao longo dos séculos, Portugal pedia a Espanha, Braga pedia a Compostela, que a justiça fosse restabelecida. Todavia, não era um proprietário a reclamar pelos seus bens, mas apenas o piedoso pedido de que se cumprisse a última vontade de São Frutuoso.
Esse dia chegou em 19 de outubro de 1966. O arcebispo de Braga, D. Francisco Maria da Silva, enviou o seu auxiliar D. Manuel Ferreira Cabral para receber das mãos do cardeal-arcebispo de Compostela, D. Fernando Quiroga Palácios, as tão desejadas relíquias do santo.
Em grande apoteose, as relíquias foram recebidas em Braga, sendo aclamadas ao longo de todo o seu itinerário. O Diário do Minho da época relata com detalhe esse dia histórico. Contudo, a última vontade de São Frutuoso ainda não estava totalmente cumprida, pois as relíquias ficaram na Sé de Braga e não no lugar que ele elegera para sua última morada.
Um regresso há muito esperado
Acolhidas em apoteose no dia 19 de outubro de 1966, as relíquias de São Frutuoso permaneceram na Sé de Braga até 16 de abril de 1967.
O clero bracarense, recordando-se da última vontade do santo, juntamente com o povo de Real, trouxe as relíquias da Sé até à igreja paroquial, num júbilo simples mas genuíno dos habitantes da terra. A vontade ficou quase cumprida… mas ainda faltava o “quase”.
É com grande alegria que, para o cumprimento integral da última vontade de São Frutuoso, Braga receberá a presença de Sua Alteza Real, o Senhor Dom Duarte Pio, Duque de Bragança.
De São Geraldo ao nascimento de Portugal
São historicamente conhecidas as boas relações entre São Geraldo e o Conde Dom Henrique, pai de Dom Afonso Henriques.
O episódio do pio latrocínio veio aprofundar o desejo de independência do Condado Portucalense, gérmen do Reino de Portugal. São Geraldo, com o seu trabalho como Arcebispo de Braga, contribuiu decisivamente para a afirmação da identidade religiosa e administrativa da região, tendo a sua ação sido essencial para a formação espiritual e institucional do futuro Reino.
Dom Diego Gelmírez, roubando as relíquias, talvez tenha evitado que os peregrinos se dirigissem a Braga, mas não conseguiu impedir que nascesse um povo que, durante dez séculos, clamou:
“Devolvam-nos as relíquias de São Frutuoso, respeitem a sua última vontade!”
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