Arquidiocese de Braga -

28 abril 2020

Terça-feira da III Semana da Páscoa

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Homilia no Paço Arquiepiscopal

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Continuo a olhar para a primeira leitura, tirada do Livro dos Actos dos Apóstolos, para que tomemos consciência do que era a vida dos primeiros seguidores de Jesus. Receberam o encargo de partir a anunciar a Boa Nova e não fugiram às suas responsabilidades. Pregavam e ensinavam, mas construíam entre si uma comunidade de olhos postos na Santíssima Trindade. Esta era o modelo. Viver em Cristo e imitando a vida em Deus Pai, Filho e Espírito Santo.

Já o referi noutra ocasião que a vida dos cristãos girava em torno de quatro pilares: Escrituras, Eucaristia, Comunhão e Oração. Todos estes momentos tinham igual importância e eram vividos como se fossem uma única realidade. Hoje, quero sublinhar a importância da comunidade. Já ouvimos dizer que todos formavam um único corpo e, como consequência, punham tudo em comum. A nada chamavam de seu e ousavam vender os bens para partilhar. É neste espírito que constituíam uma verdadeira família onde tudo circulava. Os pobres não se sentiam pobres. Tinham tudo o que era necessário. Algumas pessoas mereciam uma atenção particular. Entre elas estavam as viúvas. Numa sociedade onde só os homens trabalhavam, era natural que, depois da sua morte, as mulheres passassem necessidades. Foi por causa delas que os apóstolos criaram os diáconos. Viviam para o serviço das mesas, ou seja, atentos a que nada faltasse a ninguém.

Hoje, a primeira leitura coloca diante de nós o testemunho de um diácono. Não no exercício da caridade mas na coragem de testemunhar fidelidade a Cristo e à comunidade. Por isso foi apedrejado, fora da cidade, aceitando o sofrimento e tornando-se o primeiro mártir de uma história repleta de testemunhos. Na sua morte, importa referir aqueles que o martirizaram. Hoje encontramos muitos que continuam a martirizar os outros, retirando-lhes o que é necessário para viver. Não sujam as mãos com o sangue dos inocentes mas armam tantas situações que vão provocando verdadeiros martírios. Ao lado destes que sujam as mãos com sangue, estava um jovem chamado Saulo, que apenas guardava os mantos, preparando-se para depois também perseguir até à hora em que se converteu. É símbolo de muitos que vão lavando as mãos. Deixam correr a história de exploração e aproveitamento dos mais débeis, sem a coragem de intervir activamente. A todos, Estevão testemunhava a alegria de morrer por Cristo, pedindo a Deus que este pecado não lhes fosse atribuído como sinal de um perdão sem condições.

A figura de Estevão pode fazer-nos mergulhar no seio das nossas comunidades e da sociedade onde vivemos. Torna-se um apelo para que, também nós, sejamos capazes de viver, mesmo com o risco da morte, para que não haja mais pobreza. Onde está um cristão aí deve estar uma sentinela que vê as situações desumanas e não se fica em bonitos pensamentos. Hoje precisamos de cristãos que acordem para este trabalho de reconhecer as carências para depois encontrarem respostas de solicitude. Temos alguns cristãos que já tomaram consciência desta responsabilidade. Necessitamos de muitos mais. A sociedade sempre precisou de bons samaritanos e cireneus. O tempo da crise social que se aproxima não pode deixar-nos passivos. As situações concretas apelam a um compromisso com a causa da caridade. Importa que ouçamos este grito e não pensemos que é apenas dirigido aos outros.

Com esta crise que já vivemos, mas que se agravará muito mais, precisamos de voltar a interpretar o sentido das obras de misericórdia. Talvez nos faça bem recordar o que aprendemos na catequese. As obras de Misericórdia são catorze: sete corporais e sete espirituais. As corporais são: dar de comer a quem tem fome, dar de beber a quem tem sede, vestir os nus, dar abrigo aos peregrinos, assistir aos enfermos, visitar os presos e enterrar os mortos. As espirituais são: dar bons conselhos, ensinar os ignorantes, corrigir os que erram, consolar os tristes, perdoar as injúrias, sofrer com paciência as fraquezas do nosso próximo, rogar a Deus pelos vivos e defuntos. Ainda se recordava? Fiz bem em lembrar? Procure acolher este convite para viver estas obras pessoalmente no seu quotidiano. Depois, pense um pouco e veja se não pode encontrar um grupo para dar outra consistência a este desafio. Temos nas paróquias as Conferências Vicentinas e as Equipas sócio-caritativas. Mas em algumas paróquias não há nada organizado. Vá ter com o pároco. Tome a iniciativa. Vai fazer falta e um pouco de voluntariado na vida ajuda a ser feliz. Experimente e verá.

Neste dia, quero ainda, porque estamos na semana da vocações, deixar um convite para que os homens pensem na possibilidade de virem a ser diáconos. Foram sempre necessários na história da Igreja e hoje ainda o são muito mais. Interrogue-se! Deixe Deus chamar e não tenha receio de se oferecer a este ministério. A Igreja acolhe-vos com toda a gratidão. Sto. Estevão serviu a Igreja como diácono. Deu vida à comunidade. Sigamos os seus passos.  

 

† Jorge Ortiga, Arcebispo Primaz

 

Despedida

A Igreja nunca poderá esquecer a sua vocação social. Não se fecha nos templos mas caminha com as situações das pessoas. O cristianismo é sempre incarnado na vida e, por isso, nunca podemos alhear-nos das necessidades dos outros.

A Arquidiocese de Braga dispõe de um Fundo Partilhar com Esperança desde 2010. Tem sido resposta a muitas situações de pobreza. Alguns poderão pensar que não existe. Os factos mostram o contrário.

Sabemos que a situação social está a agravar-se e irá agravar-se ainda muito mais. Já pedimos aos sacerdotes que partilhassem o correspondente a um ordenado. Hoje, depois de ter falado nas obras de misericórdia, quero acreditar na solidariedade de pessoas e instituições. Deixo o pedido para que sejamos generosos, partilhando um pouco do que temos. Quando damos, nada nos falta.

Digo, por isso, o IBAN deste fundo PT50 0010 0000 45659640001 61 com a garantia que de administraremos com o maior rigor, procurando ir ao encontro dos que mais precisam. Que Deus a todos recompense. Continuemos a dar vida ao Fundo Partilhar com Esperança. É de todos e só pretende dar esperança a quem necessita.


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