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11 Nov 2018
Estimar e desejar a paz
Homilia na Comemoração do Centenário do Armistício
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O Evangelho desde Domingo coloca-nos diante de um dilema que, infelizmente, se vai disseminando pela sociedade e que nem sempre é devidamente enfrentado: a rectidão da postura na vida e a dissimulação. Quando os critérios que nos norteiam são os da aparência, do reconhecimento ou da grandeza, então tudo é orientado no sentido da auto-promoção. Ocupar os primeiros lugares, sessões de cumprimentos, ostentar riqueza. São realidades tão efémeras quanto falsas. Não pensemos que as pessoas não são capazes de discernir as verdadeiras intenções das pessoas.

É por isso que, de vez em quando, um simples gesto de humildade, como foi o da pobre viúva, tem a força de desmontar os esquemas dos poderosos. Na sua simplicidade ofereceu duas pequenas moedas – tudo quanto tinha e que até falta lhe fazia – em favor dos mais necessitados. Trata-se, sem dúvida, de uma grande lição de vida que nos leva a olhar, antes de mais, para os outros e a fazer-nos retirar do centro das atenções. Atitude semelhante teve, por exemplo, João Baptista que, apesar de gozar de fama, foi capaz de dar um passo atrás e enaltecer a pessoa de Jesus. Também aqui, a viúva simples, porventura a necessitar da atenção dos outros, centrou o nosso olhar nos ainda mais necessitados e não nela.

Esta atitude de descentramento, pensando sempre no bem dos outros, é, assim creio, o fundamento da paz e da concórdia. Como sabemos, a paz é muito mais do que a ausência de guerra. Ela representa a plenitude da vida e prossecução de caminhos que salvaguardem a dignidade humana e favoreçam a prosperidade da sociedade.

Os últimos Papas têm ensinado que a paz é um valor e, como tal, um dever universal a trabalhar. Não é mera ausência de guerra nem muito menos um equilíbrio estático entre forças e poderes inimigos que insistentemente desconfiam e ameaçam com conflitos. Só compreenderemos o valor da paz quando tivermos uma conveniente concepção da pessoa humana, naquilo que ela é e faz, e reconhecermos que ela está ancorada nos valores da justiça e da caridade. Ela é fruto da justiça e do amor.

“Bem-aventurados os construtores da paz, porque serão chamados Filhos de Deus” (Mt 5, 9). A nossa identidade cristã reside no facto de nos assumirmos como filhos de Deus, o que faz de todos nós irmãos sem distinção de raças, credos ou partidos. Só assim conseguimos experimentar a alegria pessoal e de relação com os outros na sequência de nos assumirmos como construtores activos da paz.

Daí que se construa, dia-a-dia, lutando por implementar o mandamento de Deus de uma fraternidade universal que trabalha pela unidade de todos no respeito pelas particularidades e diversidades de cada um. Todos e cada um têm uma responsabilidade pessoal na sua promoção pois ela deve começar a ser vivida no íntimo das opções e convicções como um valor incalculável e de importância para todos.

Hoje, mais do que nunca, teremos de trabalhar pela construção de uma cultura de paz que, à partida, sabe que qualquer tipo de violência nunca constrói a paz. “A violência é o mal, a violência é inaceitável como solução dos problemas, a violência não é digna do homem”.

Nunca podemos tolerar a guerra. “É o flagelo e nunca representa o meio idóneo para resolver os problemas que surgem entre as nações. Nunca foi e jamais o será, porque gera conflitos novos e mais complexos. Quando deflagra, a guerra torna-se uma «carnificina inútil», uma «aventura sem retorno», que compromete o presente e coloca em risco o futuro da humanidade: «Nada se perde com a paz; mas, com a guerra, tudo pode perder-se». Os danos causados por um conflito armado, de facto, não são apenas materiais, mas também morais: a guerra é, ao fim e ao cabo, a «falência de todo o autêntico humanismo», é «sempre uma derrota da humanidade»; «jamais uns contra os outros, nunca, nunca mais… Nunca mais a guerra, nunca mais a guerra»”. (Doutrina Social da Igreja, 497).

Para construir a paz teremos de promover o desenvolvimento. Neste sentido, o Papa João Paulo II foi muito assertivo ao afirmar que tal “como existe a responsabilidade colectiva de evitar a guerra, do mesmo modo há a responsabilidade colectiva de promover o desenvolvimento” (Centesimus Annus, João Paulo II). O mais importante em qualquer conflito ou perseguição será sempre salvaguardar as pessoas e proteger os inocentes. Protegê-los em cenários de guerra assim como acolhê-los quando se vêem forçados a abandonar a sua pátria para não morrerem.

Os refugiados são vítimas da guerra e de regimes opressores. Saem das suas terras não por vontade própria mas porque as circunstâncias calamitosas assim o obrigam. Neste sentido, “a Igreja está do lado deles, não só com a presença pastoral e o socorro material, mas também com o empenho de defender a sua dignidade humana”. Gostaríamos que todos os governos e instâncias internacionais seguissem o mesmo comportamento, procurando acolhê-los e oferecer-lhes segurança e dignidade. Creio que se aplica aqui o sábio conselho de Jesus: “o que quiserdes que vos façam os homens, fazei-o também a eles, porque isto é a Lei e os Profetas” (Mt 7,12). Hoje são os outras, amanhã poderemos ser nós. Não nos podemos esquecer da nossa própria história e do facto de, em tempos passados, a maldade humana quase ter levado à ruína as nossas próprias famílias.

A paz alcança-se mediante pequenos gestos. Em primeiro lugar, através de uma atitude de vida propositiva, ou seja, da procura do bem do outro. Mas, em segundo lugar, com atitudes concretas, como é caso do desarmamento e do combate ao tráfico de armas e de pessoas. Violência apenas gera violência. Disso temos provas mais do que evidentes. Basta ver os nefastos ataques terroristas. “O terrorismo é uma das formas mais brutais de violência que atualmente atribula a comunidade internacional: semeia ódio, morte, desejo de vingança e de represália”. “Os ataques terroristas são, em geral, lugares da vida quotidiana e não objetos militares no contexto de guerra declarada. O terrorismo atua e ataca no escuro, fora das regras com que os homens procuram disciplinar os seus conflitos” (Doutrina Social da Igreja, 513).

A Igreja, assim como toda a sociedade e órgãos de soberania, têm o dever de contribuir para a paz. Ela é parte integrante das nossas missões e nunca deve desaparecer dos nossos horizontes.

Peço, por isso, a S. Francisco que nos ajude a sermos instrumentos nas mãos de Deus e construtores de um reino de paz. “Senhor, fazei de mim um instrumento de vossa paz; / Onde houver ódio, que eu leve o amor; / Onde houver discórdia, que eu leve a união; / […] Onde houver trevas, que eu leve a luz” (Oração de S. Francisco).

Todos somos construtores da paz de acordo com os lugares que ocupamos na sociedade. Quanto maior a nossa responsabilidade civil e religiosa maior a nossa responsabilidade de promovermos a paz. Não permitamos nunca que os horrores da guerra se apaguem das nossas memória e tenhamos a coragem de aprender com os erros. Os que faleceram na guerra esperam isso de nós.

† Jorge Ortiga, Arcebispo Primaz

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